Supremo deve decidir se órgão público deve arcar com direito trabalhista.
TST suspendeu julgamentos; caso está com ministra do STF Rosa Weber.
Um impasse que já dura mais de um ano entre o Supremo Tribunal Federal
(STF) e o Tribunal Superior do Trabalho (TST) levou à paralisação, no
começo de março, de milhares de processos trabalhistas que tratam da
"responsabilidade solidária" da administração pública em relação aos
direitos de funcionários de empresas terceirizadas. Por esse critério,
se a empresa privada não pagar seu empregado, o órgão público que a
contratou é o responsável.
Só no TST, tramitam 10 mil processos sobre o tema. Todos estão com o
julgamento suspenso. Segundo magistrados, milhares de ações em andamento
nos demais tribunais trabalhistas também foram prejudicados.
O imbróglio - entenda no quadro abaixo - começou no fim de 2010, quando
o Supremo questionou a aplicação de uma súmula do TST que estabelecia a
responsabilidade solidária do poder público nos casos de terceirização.
Desde então, o TST alterou o texto da súmula, mas ministros do Supremo
continuaram a questionar seu teor. As súmulas do TST abordam
detalhamento de direitos trabalhistas que não estão previstos na
Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Elas não são vinculantes, ou
seja, a aplicação não é obrigatória para outras instâncias da justiça
trabalhista. No entanto, as súmulas servem de base para a decisão dos
magistrados trabalhistas em todo o país.
A TERCEIRIZAÇÃO NO SETOR PÚBLICO | |
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1988
O artigo 37 da Constituição Federal autoriza contratação pelo
setor público de trabalhadores sem concurso público desde que
constatada a "necessidade temporária de excepcional interesse público".
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1993
A Lei de Licitações autoriza a contração pelo setor público de
empresas privadas para prestação de serviços e diz que, no caso de
inadimplência, a administração pública não é responsável pelo pagamento
dos encargos trabalhistas da empresa contratada. No mesmo ano, TST edita
a súmula 331 que autoriza a terceirização para "atividades- meio".
Exemplo: a contratação por uma estatal de energia de empresas privadas
para prestação de serviços de limpeza e de vigilância.
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1997
Decreto estabelece que a terceirização na administração pública
direta (ministérios) é permitida em serviços como conservação, limpeza,
segurança e vigilância. Diz que a administração pública deve acompanhar
os contratos, mas não define responsabilidade em caso de inadimplência.
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2000
TST altera súmula 331 para estabelecer que a administração pública
tem "responsabilidade subsidiária" (é co-responsável) no caso de a
empresa terceirizada não pagar os direitos de seus trabalhadores.
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2010
Em fevereiro, Supremo reconhece "repercussão geral" em relação à
responsabilidade subsidiária no setor público. Isso significa que,
quando o assunto for julgado pelo STF - o que ainda não aconteceu -, a
decisão valerá para todos os processos na Justiça sobre o tema. Em
novembro, o plenário do STF decide que o TST não pode aplicar a
responsabilidade subsidiária a todos os processos e que a análise deve
ser caso a caso. O argumento é o de que a súmula 331 fere o previsto na
Lei de Licitações. Desde então, ministros do Supremo passam a dar
decisões contrárias à súmula do TST.
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2011
TST altera de novo, em maio, a súmula 331 para se adequar à
decisão do Supremo e diz que somente há responsabilidade subsidiária da
administração pública quando houver falta de fiscalização no contrato
com a terceirizada. Em setembro, a ministra do STF Cármen Lúcia afirma
que o TST descumpriu decisão da Suprema Corte porque somente alterou a
súmula, sem julgar caso a caso, conforme o STF havia determinado. Em
dezembro, o recurso que definirá rumo dos processos trabalhistas sobre o
tema passa para a relatoria da ministra Rosa Weber, em razão da
aposentadoria de Ellen Gracie. O processo está parado desde então.
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2012
Em 8 de março, o TST decide suspender o andamento de todos os
processos sobre responsabilidade subsidiária de ente público até que o
Supremo analise o caso.
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Fonte: Constituição, Lei 8.666/93, Anamatra, TST e STF |
Suspensão
Para evitar que, devido ao impasse, o Supremo anulasse decisões tomadas, o TST determinou, no último dia 8, a suspensão da análise de todos os recursos sobre terceirização no setor público até uma palavra final do STF sobre o tema.
Para evitar que, devido ao impasse, o Supremo anulasse decisões tomadas, o TST determinou, no último dia 8, a suspensão da análise de todos os recursos sobre terceirização no setor público até uma palavra final do STF sobre o tema.
A decisão do Supremo está nas mãos da ministra Rosa Weber, a mais nova
no tribunal e oriunda da área trabalhista - ela foi ministra do TST
antes de ser nomeada pela presidente Dilma Rousseff para o Supremo.
Não há previsão para que a ministra decida sobre o caso. O resultado
valerá para todos os recursos que chegarem ao Supremo sobre o assunto e
definirá a diretriz que o TST dará para todos os processos sobre o tema
na Justiça do trabalho.
A Advocacia-Geral da União (AGU), autora do recurso no Supremo,
argumenta que a Lei de Licitações proíbe que a administração pública
seja condenada nesses casos.
Para o diretor de Assuntos Legislativos da Associação Nacional dos
Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), Germano Siqueira, a
aplicação da súmula 331 deve ser preservada.
"Não colocar o dedo na ferida [...] é prolongar um regime de derivação,
de uma outra face da impunidade, que responde por essa relação
promíscua que passa pelas licitações de serviços e agora se pretende
colocar a conta do prejuízo na mão do mais fraco", diz o magistrado,
referindo-se ao trabalhador terceirizado.
Ele afirma, porém, que o fato de o caso estar com a ministra Rosa Weber
é um alento para quem defende a "celeridade" da análise do processo por
conta da "afinidade que tem a relatora com o tema".
A Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho (ANPT) diz que, em
algumas varas, processos sobre terceirização representam até 70% da
atuação do magistrado responsável. Ele é a favor da continuidade da
responsabilidade solidária.
"Ninguém advoga que o dinheiro público deva ser usado de maneira
inadequada. Mas nesse caso a administração pública deve responder, sim,
de forma solidária. O que se vê hoje é que as empresas privadas, sabendo
que podem vir a comparecer para pagar os direitos trabalhistas, têm
tomado cautela ao contratar empresas terceirizadas. Ao passo que o setor
público não está fazendo o dever de casa."
A juíza Erotilde Ribeiro dos Santos Minharro, do Tribunal Regional do
Trabalho de São Paulo (TRT-SP), afirma que a paralisação dos processos é
uma medida de "cautela".
"É melhor parar tudo, esperar o julgamento desse recurso, para saber
efetivamente qual vai ser o entendimento e depois julgar. [...] Se eu
julgar contrariamente ao STF, vai atrasar mais ainda. Se eu teimar, vai
ser tudo anulado para que se julgue conforme o Supremo. Haveria maior
desgaste e uma expectativa da parte que vai ser frustrada. É uma questão
de cautela", diz a juíza.
A magistrada afirma que, caso o Supremo derrube a responsabilidade
solidária, pode haver um prejuízo grande para o trabalhador. "Isso é
preocupante porque a maior parte das relações trabalhistas acaba na
terceirização e ela está no dia a dia. Em boa parte dos processos, não
haverá ninguém para pagar."
Congresso
Especialista em direito trabalhista do Instituto de Advogados de São
Paulo (Iasp), João Armando Moretto Amarante defende uma nova lei sobre
terceirização, embora critique a demora dos parlamentares em analisar
projetos sobre direitos do trabalhador.
"Deveria existir uma lei. A súmula não tem força de lei, mas os
tribunais estão tendo um papel muito importante até por conta da inércia
do Congresso. O que o STF vai fazer é uma interpretação razoável da
lei, porque a jurisprudência é clara. Se depender do Congresso Nacional,
a situação não vai ser resolvida."
Na Câmara, está em discussão "adiantada" uma nova legislação sobre o trabalho terceirizado, segundo parlamentares ouvidos pelo G1.
O projeto de lei 4330/2004, de autoria do deputado Sandro Mabel
(PMDB-GO), foi discutido durante todo o ano passado em uma comissão
especial formada por deputados - inclusive com representantes das
centrais sindicais e dos sindicatos patronais.
Em novembro, um parecer foi aprovado na comissão especial, e o projeto
agora tramita em caráter conclusivo (sem necessidade de passar em
plenário) na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Casa. Se
aprovado, será encaminhado diretamente para o Senado e depois vai à
sanção presidencial.
O projeto cria a figura da empresa especializada, proibindo prestação
de serviços por parte de empresas que realizam serviços de áreas
distintas.
O ponto polêmico é o que abre possibilidade para contratação de
terceirizados em quaisquer áreas das empresas, e não mais somente da
"atividade meio" como acontece atualmente. Por exemplo, uma empresa de
engenharia não pode contratar um engenheiro terceirizado, mas o serviço
de limpeza pode ser feito por um prestador de serviço.
De acordo com o deputado Paulo Pereira da Silva (PDT-SP), o Paulinho da
Força, que partipou das negociações a respeito do projeto, há maioria
para aprovação do projeto como está, mas ainda há discussão com parte do
movimento sindical que rejeita a proposta. Dirigente da Força Sindical,
ele se diz favorável à proposta.
Presidente da Comissão de Trabalho e de Administração e Serviço Público
da Câmara, o deputado Sebastião Bala Rocha (PDT-AP) afirma crer na
aprovação dessa regulamentação do trabalho terceirizado, considerado
"interessante" por ele.
"O projeto foi votado na comissão especial em um entendimento, em
consenso entre as centrais e o setor patronal. Agora, essa decisão do
Supremo sobre a terceirização vai forçar que a CCJ acelere a votação",
afirmou.
As associações de magistrados rejeitam o projeto de autoria de Sandro
Mabel. Para as entidades, a proposta pode levar à "precarização ainda
maior" do trabalho terceirizado.
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